Saturday 15 February 2014

Pessoas que passam por mim… e ficam. #2

Era um Sábado de Dezembro e eu trabalhava num instituto de línguas, onde ensinava vários níveis de Inglês a pessoas dos 2 aos 80. Na sexta-feira anterior tinha-me sido atribuída uma turma de Inglês, que já tinha começado no instituto há alguns meses, mas por algum motivo tinha de substituir a professora com que tinham começado o ano.

A turma era heterogénea. Tinha uma adolescente a quem eu apelidava carinhosamente de "Little Genius", pelo seu entusiasmo e capacidade de reacção; tinha uma jovem determinada e sempre com ar (positivamente) opinador, tinha uma estudante de jornalismo com um ar inovador e criativo, tinha uma outra jovem com ar meigo e olhar terno e tinha um jovem engenheiro que se via nas horas para aturar tanta mulher. E depois havia aquela pessoa, que viria a ser tão especial para mim, e a ocupar um local na minha vida que é só seu e será sempre apenas seu. 

De cabelos castanho claros ondulados, muito compridos, meio embaraçados, e de olho azulão, pele clara como a neve e sardas, muitas sardas, ela tinha aquele ar de quem não se esforçava por se aperaltar. Na verdade, e ao longo do tempo, apesar de eu sempre ter envidado esforços para que ela se aperaltasse mais, e talvez nunca lho tenha dito vezes suficientes, ela é linda tal como é, e naquele dia, toda desgrenhada e com ar descuidado, estava maravilhosa. Tinha um ar tímido, era insegura no gesto, mas sorria muito para mim. Foi a aluna que me acolheu melhor naquele dia, que me abraçou com o olhar, apesar de a turma ser fabulosa, e  de todos eles terem sido um amor. No entanto, é sempre complicado pegar a meio do ano numa turma que estava habituada a outra professora - o objectivo nunca pode ser substituir, porque somos todas diferentes, e não deixamos a personalidade fora da sala, mas sim, fazer o melhor que conseguimos. E ela acolheu-me na sua insegurança, apertou-me sem abrir os braços. 

Ao longo da aula, notava-se que ela se esforçava por falar, por ser divertida, por se integrar. Estava na casa dos 19, se a memória não me falha, e embora não conseguisse disfarçar a sua insegurança na hora de se exprimir, tinha qualquer coisa de absolutamente maravilhoso que me tocava, que me apelava às emoções. Ela tinha jeito para o inglês, embora não fosse a melhor aluna da turma, e as notas demonstravam-no. Lembro-me que era aluna de B, mas um B nada tímido, ao contrário dela. A turma era forte, era uma excelente turma, com excelentes alunos, um excelente ambiente, daquelas que não se vê com frequência, principalmente quando se trata de uma turma com adolescentes e jovens misturados.

O tempo foi passando, e eu sentia-a triste. Sentia-a só. Como professora, sempre tentei ser interventiva, principalmente em idades ainda tenras, em que sentia que podia dar algum contributo para orientar positivamente os alunos, e tive imediatamente vontade de perceber quem era aquela pessoa e como poderia ajudá-la. Um dia tive de abandonar a escola e deixei a turma. Deixei-a também a ela lá na escola, supostamente. Curiosamente, ela ficou na escola, mas a nossa amizade cresceu fora da escola e transformou-se em algo que, sei, nunca vai ser abafado. 

Hoje somos parte integrante da vida uma da outra, e qual professora (uma vez professora, sempre professora), ainda dou por mim a tentar ensiná-la com alguma frequência, mas agora a matéria já não inclui o Past Perfect, nem os Phrasal Verbs.  Ela era a aluna e eu a professora, mas felizmente temos feito o nosso caminho juntas, e confesso que também aprendi algumas das mais valiosas lições com ela. 

Em Chinatown. E sim, ela agora é ruiva. :)
Beijinhos,

A Menina dos Óculos

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